Almoçageme, Colares

Foi um dia bastante invernoso, aquele que nos calhou para visitar a Adega Viúva Gomes, ali bem perto de Colares. Mas não houve problema. Não tivémos nenhum problema com o trânsito, e a tarde foi bem passada.

Sintra é uma zona “mágica”, muito peculiar. E quando começamos a descer para Colares, essa magia mantém-se: seja pela estreiteza da estrada nacional, seja pelo romantismo da linha de comboio, seja pela vegetação luxuriante, seja pela disposição das casas e dos palacetes… E Colares é também uma vila patusca, ali incrustrada entre a serra e o oceano… Mais uns poucos de Kms e chegamos ao destino: uma localidade com o nome de Almoçageme.

É bem conhecida a singularidade deste microterroir de Colares. Sendo a 2ª região demarcada mais antiga do país, com apenas alguns hectares de vinha, ali entre a Serra de Sintra e o Oceano Atlântico, com solos arenosos, exposição a ventos salgados e nevoeiros matinais, os vinhos dali resultantes só poderiam ser singulares…

Chegamos e estacionamos o carro no Largo. E deparamo-nos de imediato com o edifício da Adega. Com um estilo retrovintage (que se mantém no interior), sobressai com elegância daquilo que está em volta. As letras lá no alto dizem que a adega existe desde 1808…

Somos recebidos amavelmente pelo produtor José Baeta. Não poderiamos faltar a tão amável convite. O primeiro sábado de cada mês é um open day. Ou seja, a adega recebe visitas (por marcação) nesse sábado às 16h, e todas as quartas-feiras às 11 e 15h.

No interior já está um casal que também vem para a visita, e que por acaso é bem entendido nisto dos vinhos, pelo que a visita ainda foi mais agradável, pois aproveitámos para trocar ideias e experiências.

José Baeta começa por nos explicar aquelas peculiaridades da região de Colares. De como a extensão é muito pequena… Como é caro o metro quadrado dos terrenos, não sendo muitas vezes rentável para a produção de vinhos… A vindima que é muitas vezes muito mais tardia que noutras regiões vitivinícolas (muitas vezes só começa em Outubro)…

Em resumo, existem 2 grandes tipos de vinhos nesta região:

  • Vinhos de chão de areia
  • Vinhos de chão rijo

Os primeiros são vinhos Colares DOC (“vinhos tipo nicho”). Os segundos, são vinhos regionais de Lisboa (“vinhos para as massas”)

Naturalmente que são os primeiros que dão o nome e a fama a esta região. Chão de areia, porque as vinhas estão implantadas em terrenos arenosos, habitualmente em pé franco, com enorme proximidade em relação ao mar. Aliás, estas vinhas foram das poucas que resistiram à filoxera, precisamente devido à profundidade das raízes, o que impedia o insecto de proliferar… Infelizmente desse tempo pré-filoxérico, restam poucas cepas…
E chão rijo, sobretudo argilo-calcário, onde são plantadas várias castas, nacionais e estrangeiras, normalmente com porta-enxerto, que originam vinhos regionais pouco afamados.

O interior da adega não é grande. Ficámos a saber que a maioria dos produtores vinifica na Adega Regional de Colares. Até 1994, era obrigatório por lei que isso acontecesse… e depois a coisa foi continuando… O enólogo de cada casa vai acompanhando o processo de vinificação, e só o estágio dos vinhos é feito na adega própria. A Adega Viúva Gomes não tem (ou não tinha até muito recentemente) vinhas próprias: compra as uvas a vários viticultores. Ficámos também a saber que existe uma parceria entre a Adega Viúva Gomes e a Casca Wines.

Basicamente a Adega Viúva Gomes tem 2 marcas de vinho:

  • Patrão Diogo (em homenagem ao antepassado) tinto e branco, vinhos regionais de Lisboa (chão rijo)
  • Viúva Gomes branco e tinto, Colares DOC (chão de areia)

O Patrão Diogo, é um vinho de gama corrente (com rolhas de aglomerado), regional de Lisboa, com uma produção de cerca de 25 000 garrafas/ano. O branco é a base de Arinto e Fernão Pires. O tinto à base de Castelão e Aragonês.
Os Viúva Gomes é que são a jóia da coroa: o tinto à base de Ramisco, e o branco à base de Malvasia (de Colares). É uma produção muito pequena: 2500 garrafas para o tinto e 1200 para o branco. Cerca de 50% desta produção vai para exportação, sendo que o principal mercado são os Estados Unidos da América (que fica com metade), mas também outros países menos óbvios como a Noruega…

Os Vinhos:

 

// PATRÃO DIOGO BRANCO – Regional Lisboa

Um vinho com aroma frutado (maçã verde); na boca é mineral, frutado, suave, agradável, muito leve, com alguma acidez final, mas no global ligeiramente enjoativo.

  • Ano: 2016
  • Castas: Arinto (45%), Fernão Pires (45%), Seara Nova (10%)
  • Teor Alcoólico: 13% vol.
  • Preço: 6 euros
  • Classificação: 14,5v

// VIÚVA GOMES BRANCO – Colares DOC


Menos exuberante do que o anterior no nariz. Na boca é seco, pouca fruta, muito mineral, muito salino e com uma acidez notável.

  • Ano: 2015
  • Malvasia (de Colares)
  • Teor Alcoólico: 12,5% vol.
  • 20 euros (garrafa 50cl)
  • Classificação: 17v

// PATRÃO DIOGO TINTO – Regional Lisboa

Um vinho agradável, com frutos vermelhos no nariz e no palato, relativamente leve, mas com alguma frescura e mineralidade que refletem o terroir.

  • Ano: 2015
  • Castas: Castelão, Aragonês
  • Teor Alcoólico: 13,5% vol.
  • Preço: 6 euros
  • Classificação: 15v

// VIÚVA GOMES TINTO – Colares DOC

Engarrafado em Dezembro 2017. Normalmente estes vinhos ficam a estagiar 2 anos em barrica usada de carvalho francês e 5 anos em tonel. Feito com 50% do engaço. É dito que tem aroma a resina de cedro… Pois, é possível, juntamente com alguma fruta… Na boca é seco, vegetal, salgado, com taninos algo agressivos mas não em demasia, e com uma acidez mineral final muito interessante. Para evoluir em garrafa nas próximas décadas…

  • Ano: 2009
  • Castas: Ramisco (95%)
  • Teor Alcoólico: 12,5% vol.
  • Preço: 20 euros (garrafa 50cl)
  • Classificação: 16.5v

E fomos presenteados com mais um topo de gama:

// VIÚVA GOMES TINTO – Colares DOC

Na altura feito com 100% de engaço (tal como aconteceu até final da década de 90). Tom mais acastanhado. Aroma licorado. Na boca todo ele é leveza e elegância, com taninos firmes, notas de farmácia, e final surpreendente pela acidez notável!!!! Em perfeita forma, e para durar!!!!

  • Ano: 1969
  • Castas: Ramisco (95%)
  • Teor Alcoólico: 11% vol.
  • Preço: 60 euros (garrafa de 650 ml)
  • Classificação: 18v

Viúva Gomes: e que futuro?

  • Adquiriram um terreno com cerca de 1 hectare e meio (3000 m de chão de areia) para terem algumas vinhas próprias…
  • Vão apostar nos vinhos biológicos…
  • E que tal Ramisco em chão rijo?? Why not?…

E assim terminámos a nossa visita. No final o produtor José Baeta ofereceu-nos simpaticamente 2 garrafas de Viúva Gomes tinto antigas para a nossa prova mensal deste mês: “Relíquias”. Prova essa que, em reunião do pessoal W4P efectuada logo após sairmos da adega, ficou assente não será cega (excepcionalmente), por motivos que explicaremos posteriormente.

Resta-nos agradecer na pessoa do Sr. José Baeta, a amabilidade do convite, da recepção e acolhimento, e do fornecimento das garrafas.

ADEGA VIÚVA GOMES
Largo Comendador Gomes da Silva, 2 e 3 Almoçageme, 2705-041 Colares
+351 219 290 903
+351 967 248 345

w4p (MAR 2018)

2 Comments

  1. Paulo Fernando

    Esquecemo-nos de dizer que a Adega Viúva Gomes também passará em breve a vinificar os seus próprios vinhos… Estão a adquirir o equipamento necessário… Não se sabe ainda se será já na próxima colheita…

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